3.27.2006

O QUE VOCÊ QUER LER?

Mas afinal, o que é que você gostaria de ler?

Da minha parte, li que a candidatura da oposição já nasce com suspeitas de favorecimento de verbas para aliados e que a da situação, enquanto permanecer no cargo, trocará de ministros, tanto os que pretendem se candidatar a cargos eletivos como aquele sobre cuja cabeça pairam tantas suspeitas e acusações.

Li que o tráfico modernizou-se, lançou a cota extra gratuita, de prêmio, disponível a cada dez compras.

Que há mares antes navegáveis e agora, intragáveis.

De um ator de novelas que está fazendo novela que diz ter-se cansado de fazer novela; perguntassem a ele, Você já pensou em quem as assiste?

Quebraram o sigilo bancário de um caseiro! Essa, sim, deveria ser a manchete do ano.

Consta da capa de uma revista que uma cantora afirma e pergunta, Sou bi, e daí? Pois é: e daí? Mais precisamente: e nós com isso? Se ela pelo menos cantasse – houve um tempo em que cantoras cantavam! Não é fantástico?

Saudosismo? Nada disso. Sentir saudades é mirar do alto de calças curtas botas de cano longo, marchando no meio da cidade. Parece que foi ontem – e foi: as tropas saíram por aí PDV porque lhes roubaram as armas debaixo dos narizes. Caramba! Parece que foi sempre.

À procura de um tema capaz de responder à pergunta lá de cima – única realmente importante para esses dedos que vão pintando de preto uma tela em branco, tolas teclas ritmadas ao invés de poéticos pincéis ou nanquins ou grafites, tela que se desfará depois em mudo e inexpressivo cinza e não uma capaz de fixar os dedos de Diego Rivera ou a multifacetada sua mulher Frida Callo -, passei por um quarto de dormir onde de fato dormia alguém, uma menina de doze anos, com um sorriso nos lábios, metade do seu rosto na penumbra, metade clareada por uma nesga de sol que penetrou pela janela sem pedir licença. Não sei se era isso que você queria ler – provavelmente não –, mas era isso o que se tinha a dizer. Mais: era isso que se tinha de dizer.

Por escrito.

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