11.25.2020

BEM VINDO, MARADONA

 Da próxima, que me convidem para o nascimento do Maradona, não para o velório. Que me arrastem a brindar um gol dele, não a acompanhar seu velório. Que a vida seja sempre festejada e a morte adiada. Mais que o sofrimento, a fraqueza, a queda, muito mais dói o velório. Da próxima vez, me convidem para o nascimento, o gol, a glória. Que o velório fique para quem propague e idolatre a morte, a quem a ela dê de ombros. Fico do lado de quem nasce, do lado de quem sobrevive. De quem vai, a saudade é tanta que é como se não tivesse ido. Bem vindo, Maradona. Bem vindo.

O SERMÃO DO ASFALTO

 

Em verdade vos digo, em economia, Deus não há.

Naquele tempo, Smith, Marx, Mises, Keynes, Hayek criaram teorias baseadas em determinados contextos, e as discutiram, às vezes entre si, outras com outros teóricos, e, mais frequentemente, sós.

Irmãs e irmãos, não deis ouvidos nem tempo àquele que oferece teorias como roupas a vestir territórios de regiões e tamanhos distintos, a agasalhar povos de origens, histórias e culturas diferentes.

Em verdade vos digo, prêt-à-porter, prontas para usar, em qualquer tempo e lugar, somente roupas de estação e moda feitas em série, a um preço para quem possa pagar.

Viremos agora a página.

Naquele tempo, Conrado Gini criou um coeficiente, um índice para medir a concentração de renda. Gini então disse: quanto mais vizinho de zero for esse índice, menor a concentração; quanto mais perto de um, ou de cem ou de mil se por cem ou mil for multiplicado, maior ela é.

E a que explicava explicou: quando e onde o coeficiente de Gini é baixo e a renda média por cidadão é alta; quando e onde a concentração de renda é baixa e o PIB per capita é alto, e há educação para compreender o que são essas coisas, se está perto da civilização.

E o que citava e dava exemplos exemplificou e citou: por exemplo, Holanda; para citar, Noruega.

E a que explicava explicou: quando e onde o coeficiente de Gini é alto e a renda média por cidadão é baixa; quando e onde a concentração de renda é alta e o PIB per capita é baixo, e não há educação para compreender o que são essas coisas, se está perto da barbárie.

E o que citava e dava exemplos exemplificou e citou: o Brasil.

Em verdade vos digo, a discussão entre Estado Mínimo e Estado Máximo é um barco afundado no oceano da realidade. Holanda e Noruega têm participações do Estado na economia totalmente desproporcionais entre si, e assim o é nas duas maiores economias do mundo.

Em verdade vos digo, cada povo, mais do que deve, tem que encontrar soluções próprias para suas próprias e únicas realidades.

Viremos a página mais uma vez.

Naquele tempo, a Constituição da República Federativa do Brasil era do Estado do Bem Estar Social. O Estado, por meio de Governos, garantiria direitos, como à vida, à educação e à saúde, e teria como três dos seus cinco fundamentos a cidadania; a dignidade; e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.

Em verdade vos digo, em vez de se discutir em Bizâncio teorias que geralmente sequer são conhecidas por quem as professa; ao invés de proferi-las no deserto para seres soterrados pelo egoísmo dos imbecis,

Praticar os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa bem poderia pôr o Brasil no Mundo.

Palavra da reflexão.

 

11.17.2020

RELIGIÃO

 

A começar que sou herege, porque sou grego. Politeísta. Acho muita responsabilidade deixar tudo nas costas de um só. Ou de uma só. Nascemos de mulheres, deus é deusa. Zeus é Afrodite, acredite se quiser.

A continuar que sou hebreu expurgado sem nunca ter sido. Panteísta. Como Baruch Spinoza. Deus está, em toda parte, não propriamente é. Vá dizer isso em inglês ou francês e depois fale mal da nossa língua.

A permanecer que sou africano. Há espíritos do bem e do mal. Incorporam na gente sem que a gente perceba.

A enlouquecer todos os dias que sou católico luterano. Peço desculpas e que Jesus leve consigo minha culpa. E que Maomé só expresse o que for amor e paz.

A ficar que sou budista, desapegado de quase tudo, menos das gentes.

A ilustrar que sem ter nenhuma tenho infinitas religiões indianas que sequer conheço.

A confundir que sou kardecista, com a diferença de que reencarno todos os dias em outro planeta, cheio de sol, de lua, de mar e montanha, de canções, de vinhos e de mulheres-deusas interessantes e inteligentes, todas minhas amigas. Uma será minha amante, que dará luz à nossa filha. Haverá homens, somente aqueles que me são amigos.

A terminar que não haverá um final.

11.06.2020

HOMEM E MULHER

O texto a seguir foi postado em 9 de setembro de 2017. O atual título era subtítulo de "Cortinas de fumaça". À exceção de ter sido retirada a última frase - Ou não tem nada a ver? (que não tem nada a ver) -, tudo permanece igual, pois parece que foi hoje.

Dizem que religião é um dos assuntos proibidos, mas, se não nos falarmos, aí mesmo é que não vamos nos entender, e dar de bandeja para quem ganha com isso.

Há bons religiosos, que desempenham seu papel com a intenção de fazer o bem, de trazer conforto, esperança, consolo, remédio e comida. Uma coisa é o religioso; outra, o manipulador.
Se tivermos sorte e determinação; se conseguirmos protestar e discordar civilizadamente, mantendo as amizades acima das nossas paixões e supostas verdades em matéria política, teremos eleições em 2018. (Que ninguém se iluda, isso depende de nós.) É bastante provável que alguns candidatos de 2014 o sejam novamente. Lembro-me de mais de um que falava sobre qualquer coisa e depois concluía: “Para mim, casamento é entre homem e mulher”. Pouco importava se a questão era o panorama político, beirando à ruína; o andar para trás da economia; a cruel e burra distribuição de renda – a 76a entre 136 países; a violência a passos largos para a barbárie; ou as hordas de desgraçados vendendo ou se entupindo de drogas, principalmente a mais barata e vil, por absoluta desesperança e falta de oportunidades, a grande maioria desde o nascimento. Nada disso importava, o que realmente importava para aqueles candidatos era o bordão que os conectava: “Para mim, casamento é entre homem e mulher”. Não se elegeram, nem se esperava por isso, mas alcançaram o que queriam: abocanhar mais poder. Seus eleitores não pensam sobre si - suas péssimas condições de vida, seus filhos fora da escola ou a frequentando sem condições de aprendizagem, podendo ser mortos dentro da escola, enquanto os nossos filhos, tomara – Deus queira - que voltem para casa, sãos e salvos.
Os eleitores dos que levam livros religiosos para o lugar errado, apenas para abocanhar mais e mais poder, mera, covardemente fisiológico, convivem conosco, em nossas casas, em nossos trabalhos, nas lojas, nas ruas. Mas não os vemos, somos de mundos diferentes. Eles nos veem. E nos escutam. Como falar com eles?