12.08.2012

NIEMEYER, JOBIM, NELSON RODRIGUES... E UM PEQUENO TRATADO SOBRE A BURRICE


Em meu poema “O Burro”, expresso minha opinião de que a burrice humana se difere da do animal propriamente dito, por ser este uma espécie de José Régio em seu “Cântico negro”: “Não sei por onde vou, não sei para onde vou, sei que não vou por aí”. Acontece que ambas têm este ponto em comum: a vontade.  O burro empaca por vontade, a digna vontade de não ser montado ou carregar coisas para ele inúteis. Pessoas, geralmente sem passar nem perto de alguma expressão da dignidade, optam pela burrice – aquela que é exclusivamente humana.

Quando eu era professor particular de Matemática e Física, mais de uma vez tive alunos cujos pais me diziam para que eu não perdesse meu tempo, porque o aluno ou a aluna – a filha ou o filho deles – era uma pessoa burra. Aqueles pais escolheram que seus filhos fossem burros. Nesses casos, meu trabalho não era exatamente ensinar Matemática ou Física, mas convencer aquele ou aquela adolescente (será que eu deveria dizer adolescenta?) de que ele ou ela não sofria de modo algum de burrice. Modestamente, ajudei-os a passar de ano e também a que fizessem a opção certa: a de não imitar seus pais, já que seus pais, por opção deles, pai e mãe, eram os verdadeiros burros, humanamente burros.

Uma das célebres frases do amigo do Oscar Niemeyer Tom Jobim é: “No Brasil, sucesso é ofensa pessoal”. Pela vontade de alguns, Oscar Niemeyer seria condenado à forca depois de morto, porque era comunista. Pior ainda: Niemeyer era comunista e rico – coisa que não pode ser admitida pelos idiotas da objetividade. (Sua benção, Nelson.) Eu nunca fui comunista, por pensar que Marx e Engels, em seu Manifesto, acertaram no diagnóstico mas erraram na receita. Porém sou capaz de adivinhar que o igualitarismo sonhado por Oscar não era o da mediocridade. Li numa das mensagens que recebi que ele teria mamado nas tetas do poder público. Funcionários, empregados, profissionais autônomos, empresários, uni-vos! Ser pago pelo trabalho que se faz é mamar nas tetas de outrem! Outra pérola: alguém que não conheço, cuja mensagem me foi repassada por um amigo de quem costumo discordar e por isso sempre me faz lembrar Voltaire, disse que não podia opinar sobre a obra de Niemeyer por não ser arquiteto. Atenção. Se você estiver ouvindo Mozart ou Beatles neste momento, se não for músico, desligue o som. Se não é jogador de futebol, quem é você, que não sabe o que diz, alô Noel, para chamar Pelé e Messi de craques? E não venha me dizer que gosta da Maia Desnuda, a não ser sem roupa e com óleo e pincel no bolso.

Pior do que a clara opção pela burrice de não sentir o prazer de ter nascido no mesmo país do Niemeyer – que equivaleria a de um argentino de debochar de Jorge Luís Borges – é a covardia. Esperaram o ancião morrer para cuspir e espalhar uma medíocre, típica inveja do sucesso. Tom Jobim neles.

Claro: desde que sejam músicos. O que, convenhamos, é pouco provável.

10.14.2012

EU NO FACEBOOK

Eu no facebook
acabo de dizer o que estou pensando
o que deve representar certa gravidade:
faço paralelos entre o lançamento de um livro e a gravidez.

Eu no facebook já me adicionei e fui adicionado.
Sou um sinal de mais
Progressão Geoaritmétrica e com linha do tempo
O que deve representar certa gravidade

Porque o tempo é esse desconhecido
Quarta dimensão de quem terá sido
Não mais que um embrião.

Agora fico aqui e fico lá
Pasmo de mim mesmo em outros lugares fora de mim
Mesmo fazendo sonetos que dizem de mim.

9.25.2012

NÓS E A SUSTENTABILIDADE - CONVITES




NÓS E A SUSTENTABILIDADE


 
Por mais de dois anos venho trabalhando em um livro com temas da sustentabilidade, em parceria com Silvia Valdez, que divide comigo a organização, e mais catorze autores. Desde a concepção do livro, o convite aos autores e demais colaboradores, o recebimento, o projeto gráfico, a revisão e a diagramação para impressão dos textos, até seu envio para impressão, um extraordinário trabalho em equipe, que não deixou de ter alguns momentos de fortes emoções – por exemplo, o fechamento de um dos locais previstos para o lançamento, que está confirmado para 4, 8 e 9 de outubro, respectivamente em Florianópolis, Rio de Janeiro e São Paulo. Já, já, aqui e em muitos outros lugares e meios, os convites, com locais e horários. Meus emocionados agradecimentos a todos que dividiram conosco essa realização.

mariobenevides.blogspot.com, 25 de setembro de 2012.

7.21.2012

FRIO


Com esse frio
Quem não tosar um bicho
Vai ter que vestir jornal.
Com um noticiário que
Capaz de pegar doença.

7.07.2012

HÉLIO DE LA PEÑA, OS DEZESSETE DA KOMBI E OS DEZOITO DO FORTE


Sábado ventoso em Florianópolis, minha mulher, gripada, enquanto nossa filha ainda está a caminho, de férias, voltando da serra gaúcha, e de ônibus, pedimos um peixe para almoçar em casa. Para acompanhar, ela, um tinto, eu, um Chardonnay, que se encontravam entocados e intocados na adega do apartamento, verdadeira personagem de novela moderna: artificial e sincera. A rádio FM tocava boas músicas, até que, às tantas, um David Byrne que, com minhas indevidas desculpas a ele e ao Caetano Veloso, ultimamente não me tem agradado. Por isso, depois do almoço, a TV. Eis que Angélica entrevista o Casseta Hélio de La Peña, vestido com a camisa do Botafogo. Nada contra qualquer outro sotaque - pelo contrário, sou viciado neles –, mas o carioca me inebria, muito mais que um tango, que um Malbec ou um Chardonnay. Nada contra qualquer time, a não ser o Boca Juniors, esse antijogo da modernidade - mas o Botafogo, na i-ne-nar-rá-vel narrativa do locutor Casseta, é o de 1967 e 68, o de 1989, o de 1995 e o de 2010; é o de um barão holandês, que, como o Bafo da Onça, acabou de chegar, cujo nome não sei - mas sei que é casado com uma brasileira e que seus antepassados vieram a nado da África para que ele nascesse na Guiana; é o de uma van, com samba da Beth Carvalho e hino alvinegro primeiro e único cantado pelo Zeca Pacodinho, em companhia de Edson Celulari, Marisa Monte, Ed Mota e mais alguns outros notáveis botafoguenses, que se perguntam: - Mas não éramos dezoito? De pronto, um deles esclarece: - Não, os dezoito eram os do Forte.
Pois é de longe que grito e tento por eles ser notado:
- Jesus Cristo, estou aqui! Somos, sim, dezoito! E atenção! Loco Abreu a vista! O branco-e-preto é outro, mas, nos pênaltis, em se cavando, tudo dá!
E assim me despeço: vou à livraria procurar o livro do Hélio de La Peña, que conta o Botafogo para crianças. Ele está certo: o Botafogo sempre será para crianças.

6.18.2012

O POETA E QUEM SENTE, MATEMATICAMENTE


Fernando Pessoa, um dos seus para sempre. O poeta é um fingidor, finge tão completamente, que chega a fingir que é dor a dor que deveras sente. O que o poeta não disse, por falta de vontade (mais provavelmente), é que o hipócrita é o fingidor que finge tão completamente, que chega a não saber que é dor a dor que deveras sente. Que o cruel é um sofredor, persegue e subjuga tão repetida, tenazmente, que sabe e tem prazer na dor, a dor que deveras sente. A troco de que isso agora? zero, matematicamente.

5.29.2012

ANÚNCIO DE JORNAL


Agora é que o cara conseguiu me reinicializar e ainda não consultei certos sites que conheço. Não sei se as ilhas gregas foram vendidas, se as Falklands se tornaram Malvinas ou se Falklands e Malvinas abraçaram a Grécia, mergulharam com ela e encontraram sem braços uma estátua de mulher nua em dorso e nariz. Outra uma lanterna, outra uma castanhola, outra um ritmo a se desdobrar em muitos. Talvez a alemã ainda tenha saldo no banco, espero que a brasileira também. Que o mundo de repente se perceba desarmado e goste. Que os aviões planem em silêncio e lágrimas, suas asas acolham crianças e as ninem longe de barulhos. Que os generais não queiram guerras. Nem poder. Que este seja público. Cheio de vergonhas escancaradas. Que gurus não existam. Que a verdade não exista, que a maioria sim. Eu notebook. Aceito e-mails.

2.21.2012

ENQUANTO VOCÊ DORME

Enquanto você dorme, eu escrevo. Sou um inquieto. Um ansioso. Parafraseando Louis Armstrong, High anxi... high anxiety...

Enquanto vejo você dormindo, me aquieto.

Quando você acordar, isto será mais uma declaração de amor a você.

Mesmo com o cão fungando nervosamente deitado no chão ao meu lado.

Hoje é feriado. O dia nasce quase em silêncio. Um outro cão late, pássaros comemoram o sol, um ou outro carro passa na rua lá embaixo.

Ontem à noite, você me perguntou: - Você está ouvindo o helicóptero?

Ontem à noite, voavam um helicóptero e um ventilador. Que permanece voando, seu zumbido é como o de um avião pequeno. Menor que um helicóptero, claro.

O cão ao meu lado está em silêncio, agora, enquanto, lá fora, um pássaro se destaca dos outros, avisa que vai se afastar e se afasta. Vai para longe, uma outra árvore, que deve estar longe da primeira. Não vou à janela, mesmo porque, agora, todo momento é um novo agora, há uma sirene.

Isto será necessariamente uma declaração de amor, seja em que formato for, seja com que conteúdo for. Uma declaração de amor a você, que dorme profundamente.

Minha ansiedade passou. Há vezes em que ela passa. Há outras em que ela se passa.

Você dorme bonita como sempre – e como sempre, lembro, em prece, Vinicius e Tom:

“Pra que ela acorde como o dia... oferecendo beijos de amor...”

Um sorriso. Me bastará um sorriso seu. Alguém dirá, Mas ele não tem mais nada pra fazer, que escrever uma banalidade?

Eu poderia fazer o Tratado Geral das Banalidades. Tratado Geral das Coisas Banais – por Mario Benevides. Antropólogo, sociólogo, farmacêutico e hermeneuta. O antropólogo, sociólogo, psicólogo e hermeneuta Mario Benevides acaba de lançar o seu Tratado Geral sobre Coisa Nenhuma. Grande confusão causou a repórter, ao chamar o autor do tal Tratado de proxeneta, desculpando-se depois: - Eu queria dizer astronauta.

Dorme, meu amor, embora o alarme do estacionamento tenha se sobreposto ao canto do pássaro. Há todo um mar, ainda. Poluiu-se recentemente por causa das chuvas, porque se misturam, nas chuvas que caem, excrescências de excrescentes que ligam as excrescências deles nas redes fluviais e pluviais. O rio, o mar, a chuva, o sol, enquanto houver sol e for feriado, iremos à praia. Leremos um livro e uma revista, nos alternando entre uma e outro, entre umas e outras, que serão poucas, moderadas, pode acreditar em mim. Rabiscarei mais umas linhas do meu tratado inútil e depois dormirei, à tarde, enquanto você fará uma visita ou uma caminhada.

Assim somos, fomos feitos, sonhos, sonos, planos. Ansiedades. E calmarias.

O CONSELHEIRO

- Quando eu contei pra ele, ele chorou.
- Qualquer maneira que ele reagisse, você não iria gostar.
- Eu preferia que ele gritasse.
- Se ele gritasse, batesse em você, se ele saísse batendo a porta, se respirasse fundo e dissesse palavras racionais ou mesmo bonitas... se ele ficasse em silêncio, profundo, misterioso, indiferente ou desdenhoso... nada, nada iria agradar a você.
- Não sei.
- Pode ter certeza, é assim que nós somos. A gente quer que aceitem o que a gente diz, não importa o que. Nem a quem. Somente se ele concordasse com você...
- Não era uma questão de concordar, mas de aceitar, de achar natural, sabe, até achar... bonito.
- Poucas pessoas acham isso bonito.
- Mas faz parte da vida.
- Tem muita coisa que faz parte da vida que não é nada bonita.
- Ah, mas não valem comparações com crimes, violência, isso não tem nada a ver com essas coisas.
- Concordo. Mas é algo que, para a maioria, ainda não é normal.
- E o que é normal?
- Um dos sentidos é estar de acordo com uma determinada norma. Ainda que hoje a norma – a lei - seja aceitar, incluir... a norma social de muitos ainda é contrária. Já foi pior, você sabe.
- Eu fiquei muito chateada.
- De qualquer jeito você ficaria. É normal.
- O que é que eu devo fazer?
- Tentar de novo. Vá lá e volte a conversar com ele.
- Pra você é fácil.
- Claro.
- Não é com você, não é? Não tá nem aí... Conselho, se...
- Pague a conta. E vamos embora.

1.22.2012

PERGUNTAS, SAMBAS E FOTOGRAFIAS

Meu amigo Luiz Mauro Beethoven, em resposta a uma mensagem minha, gentilmente me chama de Lima Barreto e me pergunta se a letra de um samba que escrevi há alguns anos tem música. Sim, eu respondo, mas, como foi feita por mim, que não sou Beethoven nem sambista, pode se parecer com a de um outro samba, como saber? E como grafá-la, se não sou pianista como os dois Luíses Beethovens? Meu amigo, que já desfilou numa escola de samba, me manda uma foto de um quarto (será uma sala?) que fica numa cidade chamada Modesto, na Califórnia, da casa de um amigo dele, onde, numa estante, se encontra um exemplar do meu romance “A revolução do silêncio”. Essa revolução nasceu “A dinastia de Ricardo Coração dos Outros”, nome do professor de violão de Policarpo Quaresma, claro, de Lima Barreto, primeiro e único. Luiz Mauro me pergunta se haverá outro livro meu no oeste americano. Modesto, pergunto: haverá uma Califórnia? Ou tudo não passou de um sonho de um dia de inverno, quando alguém entrou numa igreja e fingiu rezar? E uma Liverpool onde um baixista canhoto pergunta de onde todas as pessoas solitárias vêm e a quem elas pertencem, haverá? Onde metade do que um míope diz é sem sentido, mas ele diz assim mesmo, para alguém de olhos de concha e cabelos de céu flutuante, enquanto uma guitarra suavemente chora? Um submarino amarelo, uma banheira, haverá uma banheira com duas cantoras e dois cantores dentro, alguém sabe? Eu e meu irmão, que também se chama Luiz e, como eu, nada sabe de piano, já fomos vizinhos do Luiz Mauro, na Rua Álvaro Ramos, em Botafogo, em frente ao Barbas, um bar do Nelsinho Rodrigues e outros barbudos, para onde eu sempre fugia de uma empregada que não gostava de mim, por mera questão de reciprocidade. Luiz Mauro, na mesma mensagem, me manda um link com fotos do aniversário da Rosa, quando estivemos com ele. Ela me diz, Salva as fotos, grava! Rosa supõe que links sejam como banheiras com cantoras e cantores dentro: passageiros. Eu acho que ela tem razão. Algo que eu nunca tive. Com meu especial abraço para o Luiz Mauro Gomes Silveira, meu amigo Beethoven II, aí vão a letra, a foto e o link.

EU, GRANDE GATSBY

O meu pai é barítono,
eu nasci tenor.
A mãe é Flamengo, eu,
tricolor.
Pedi uma Coca,
só tinha Pepsi,
eu, grande Gatsby,
já não tenho glamour.
Mon amour toujours,
vou fazer uma tour
na Paciência,
por causa da Hortência,
que não joga basquete,
que é garçonete
no bar do Nestor.

O meu pai é barítono,
eu nasci tenor.
Ela é vascaína, eu,
sofredor.
Pedi uma Pepsi,
só tinha diet,
eu, da society,
já não tenho glamour.
Mon amour toujours,
vou fazer uma tour
na Piedade,
fiquei na saudade,
nem mesmo a Adelaide
me quer como amor.

O meu pai é barítono...





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1.14.2012

O INTERNÁUFRAGO E AS VISITAS

É sempre um prazer receber visitas, principalmente de quem me reconhece neste espaço, que geralmente não me via faz tempo e me pergunta: "Mas é você mesmo? Lembra de mim?". Não só sou eu mesmo como sempre me lembro, e muito gostaria de responder às mensagens que chegam em meu endereço de e-mail - que, como vêm via comentário no blog, não contêm o respectivo do autor ou autora, meus muito bem-vindos visitantes. Fico eu sem poder responder, a ver navios, que ainda por cima são virtuais, não me permitem sequer a tradicional mensagem dentro de uma garrafa. Assim (e pela segunda vez), seguem meus dois endereços para correspondência, os quais vou incluir também no campo do meu perfil (o que, evidentemente, já devia ter sido feito há muito tempo): mariocsbenevides@hotmail.com / mariocsbenevides@gmail.com.

Da ilha de Santa Catarina, Florianópolis, hoje com chuvas e céu cinzento,

Mario, o internaúfrago.

1.07.2012

PAUSAS

Haverá inspiração para quarenta minutos de sobra de lan-house?
Em Búzios?
Depois da primeira frase, uma pausa; restam trinta e três minutos.
Há uma falha na barra de espaço e este de repente se ausenta,
implica, requer que eu replique, reclique, reaperte, reaplique
a barra de espaço, para produzir uma pausa,
simples espaço entre duas palavras.
Pausa maior, só se for um

parágrafo.

Reticências, uma pausa maior que um espaço,
menor que um

parágrafo.

Se o texto for uma peça de teatro,
a pausa se pede por extenso: pausa.
Longa ou curta,
pau-sa.

Vinte e quatro minutos.
Menos,muito menos que vinte e quatro horas,
Hoje,
um belo dia de sol em Búzios.
Dia de vagabundos,
de quem está de férias,
o que não é o caso da lan-house e seu ad-
ministrador,
que trabalha onde eu divago,
passeio com palavras,
brincando com o tempo,
não é sempre assim,
raro isso é
possível.

Fico por aqui,
quando ainda me restam vinte minutos.

Pelo menos de lan-house.

Pelo menos nesta lan-house
que fica em Búzios.