11.27.2014

ADÉLIA

Meu pai disse a ela que a seleção do Brasil ia jogar contra a de Portugal.
- Ora, Seu Benevides, como vão jogar uns cá e outros lá?
Hoje, Cruzeiro e Atlético jogaram uns cá e outros lá. A partida foi no estádio do Cruzeiro, cá, com parte da torcida no estádio do Atlético, lá.
Adélia, não sei onde você está. Só sei que continuamos assim: no mesmo jogo, do mesmo lado, uns cá e outros lá.

11.02.2014

MEU AMIGO RUBENS FEZ 60 ANOS


Conheci o Rubens quando eu tinha uns dezesseis anos, e ele, acho que já tinha chegado aos dezessete. Estávamos em uma festa, eu fui dançar com uma garota, e o Rubens ficou fazendo caretas e sinais pra mim. Claro, perdi a garota, mas ganhei um amigo de uma vida inteira.

Rubens ontem fez 60 anos. Como em todos os aniversários, já teve umas três comemorações e terá outras tantas nos próximos dias, nos mais variados bairros do Rio de Janeiro. Continua o mesmo que eu conheci, com as mesmas feições, o mesmo físico, o mesmo bom humor quando tem razões para isso e, quando há motivos para ficar mais quieto e calado, é assim que ele fica, desde que nos conhecemos. E conhecendo o Rubens como conheço é que vivo me perguntando por que falam tão mal da dita terceira idade. A começar que essa é uma conta das mais estranhas. Tudo leva a crer que a primeira se encerre aos 40. Ora, do nascimento aos 40, quantas vidas em uma só se tem, não é? Aos três, aos sete, aos quinze, aos vinte e cinco, aos trinta... Difícil encontrar semelhanças no que vivemos entre idades tão próximas ou um pouco mais distantes umas das outras, nessa que deve ser a primeira idade.

A segunda é mais curta – pelo que posso depreender, vai dos 40 aos 59. Com mais precisão, até os 59 anos, 364 dias, 23 horas, 59 minutos e 59 segundos (espero não ter errado na conta: não fica bem para um engenheiro; mas que seja perdoável a um poeta). Aí, quando chega o primeiro segundo seguinte, a pessoa ingressa na terceira idade. Uau! O mundo acabou. Você pode até malhar e fazer Pilates, mas inevitavelmente passa a ser aquele velho encurvado sobre uma bengala, carregando o mundo nas costas a quem dão prioridade no check-in, ainda que no embarque convidem você com prioridade para a (sua) melhor idade – outra idiotice dos nossos tempos.

Até que não inventem a quarta, a terceira idade vai até a morte - que poderia, aliás, ter acontecido antes, e esse é o primeiro motivo para uma boa risada do e com o Rubens. Outra coisa: não moramos na faixa de Gaza, o que por si já é uma baita de uma sorte. Por que, então, lembrando Fernando Sabino, sair por aí caçando angústia? Por causa da idade? Ora.

Nascemos com a vocação para a exceção. Não se tem uma impressão digital única impunemente. Outra coisa. Devemos mirar nas exceções ou na mediocridade? Em uma época de roqueiros setentões na estrada cantando suas músicas, por que ficar por aí, já aos 50, dizendo que está ficando velho? Se há um Leonard Cohen elegantérrimo aos 80, compondo e cantando blues com o mesmo talento e a voz rouca de sempre, que história é essa de se aborrecer porque alguém ofereceu o lugar a você? Agradeça, ora. Se preferir, fique de pé e, a seu gosto, modesto ou altivo, diga, Não obrigado, estou bem assim.

Tenho outro amigo que conheço faz poucos anos, que já se aproxima dos 70 de idade: Júlio Pavese. Lê mais livros do que eu consigo comprar e enfileirar na estante, viaja, filma e fotografa mundo afora, tem uma vivacidade mental astronômica - um dos melhores papos que já conheci.

É em gente assim que eu me inspiro. Quando eu crescer, quero ser que nem eles.

Parabéns meu irmão Rubens, o mais novo sexigenário da praça. Muitas felicidades pra você.