11.22.2009

OB

Eu sei que você às vezes me visita sem deixar cartão ou comentário. Sei de outros que também passam por aqui, só que por meios sinistros, aracnídeos, troianos e seus tentáculos, deixando comentários ininteligíveis e algum tipo de vírus - como este, de uma ligeira gripe, das tradicionais, da garganta arranhando. Sei muito bem distinguir um dos outros - e é a você, que me visita apenas para ver se há novidades por aqui, que me dirijo. E com muito prazer.

Morreu um corrupto. Pelo menos isto: eles também morrem. Dirá você que mortes não devem ser comemoradas. Aliás, é praxe, no Brasil, canonizar todo e qualquer morto. Este, que morreu ontem, é muito pouco provável que seja canonizado por alguém. Mas faltam muitos e não vamos matá-los nem ficar esperando que eles morram. Falemos da vida - da alheia, naturalmente.

Hoje é domingo e de vez em quando chove, mais pra chuva do Tom Jobim, "prazenteira", e não dessas que, ultimamente, têm causado tantos terríveis estragos. Já no sábado passado, do fim de semana passado, um dia de quase-sol, fomos à praia, em um ponto badalado de Jurerê, Florianópolis. Uma moça parecia ter cola nas mãos: uma delas trazia colada uma garrafa long-neck de cerveja; a outra, um cigarro. Do seu biquini, saía o rabinho de um OB, só que este não estava grudado: ele tremulava ao sabor do vento. Senti saudades da personagem da Camila Pitanga e sua "catigoria", como senti saudades da mulher de classe - que não necessariamente é a classuda. Uma classuda pode até ter classe, mas vive em uma atmosfera de ex-modelo - e modelos, como se sabe, podem ou não ter classe, ainda que sejam classudas, do mesmo modo que saudade nada tem a ver com saudosismo.

Saudades desta expressão - "modelo" - que deu lugar à de "top model". Saudades do Tom Jobim e saudades - eu era um garoto - de quando a Leila Diniz exibiu sua barriga de grávida, tão natural quanto a menstruação da moça do OB e seu rabinho esvoaçante.

Saudades de você, que me visita com ou sem comentários.

Se você é a moça da praia do sábado passado, do fim de semana passado, algumas sugestões: largue o cigarro; de vez em quando, deixe a long-neck dentro do isopor ou jogue-a fora no lixo, assim que a cerveja acabar ou ficar em temperatura desagradável; vá até o mar, dê um belo de um mergulho, nade um pouco e ponha o rabinho do OB pra dentro do biquini, porque ele não combina, assim, com esta postura de rabinho tremulante ao sabor do vento; e, mais importante, mantenha este seu sorriso, genuíno como barriga de grávida, genuíno como sua menstruação, genuíno como genuína é esta sua alegria, que me deixou aqui, neste domingo de chuva prazenteira, cheio de saudades.

11.04.2009

X TUDO

Esse é o nome abrasileirado de um sanduiche que leva de tudo: da maionese à rúcula, passando pelo bife de carne muída prensada e queijo mussarela. Aceita tudo. Foi assistindo na tv a cenas deprimentes da política japonesa, nas quais congressistas se esbofeteiam e vão ao chão de terno e gravata, causando inveja aos lutadores de sumô, que mais uma vez me convenci do óbvio: não só o brasileiro não sabe votar: ninguém no mundo sabe votar, pois, se um e somente um o soubesse, todos diriam a ele - ou ela -: "Vá e vote por todos nós". Como ninguém sabe votar, todos votam; esse, o elementar princípio das eleições - ou mesmo dela: da democracia.
E o X Tudo com isso? Quem aceita tudo e leva de tudo é o nosso popular eXcluído de Tudo - o X Tudo. Se eleitores majoritariamente esclarecidos - caso presumível dos japoneses - se miram em seus representantes democraticamente eleitos reduzindo aos tapas seus supostos, esperados, talvez inexistentes argumentos, nossa imensa maioria de X Tudos, aceitando desde café da manhã requentado com o prefeito até vale-combustível em troca de voto, naturalmente que não espera por argumentos, mas comida, escola, emprego, etc. - dando margem a toda espécie de canalha, que quer é ver a conta de X - vezes - se tornar exponenciação de X Tudos, carentes a ponto de suportar sua canalhice e inutilidade e de multiplicá-los, a eles, os vis, os abutres, os que se distinguem de todo e qualquer corrupto, porque roubam de quem não tem e, por causa deles, os vermes, não terá.
Ultimamente, não raramente tenho sido convidado a palestrar por aí. X Tudo é a imagem que tenho usado nessas oportunidades. X Tudo, na esperança de que nosso gosto se modifique, nossa vontade de aceitar qualquer coisa se apague, nossa exigência tome o lugar da mistura sem gosto e indigesta de tudo que junto não combina, de tudo que é tão diferente de quem gosta de eleição, democracia, respeito; de inclusão e multiplicação de oportunidades e perspectivas, incluindo a de escolha, ao invés de exclusão de gente e sua dignidade.
X Tudo, nem light.