4.29.2009

AGORA, FALANDO SÉRIO

Bandalheiras à parte - sem perdoá-las ou esquecê-las jamais -, alguns momentos da História recente não são de se jogar fora. O primeiro deles foi ter à frente da Economia um político: FHC. Depois, à frente do Banco Central, um e depois outro banqueiro. A falsa impressão de que o brasileiro não tem memória, que pode ter sido reforçada pela reaparição de indigestas figuras cheias de poder novamente, claro que acontece pela manipulação covarde da turma da bandalha, que dela se beneficia e se locupleta e se vomita. Um faminto de tudo - da comida à instrução, à mais rudimentar capacidade de discernir - acreditará em qualquer hipócrita que se apresente oferecendo migalhas, trazendo consigo santinhos com o retrato de si próprio, de seus padrinhos - as referidas indigestas figuras - e, destas, seus mais recentes pares, a permanentemente renovar o que há de pútrido na pátria amada. No meio disso tudo, dois políticos que sabem disso tudo e - impossível não reconhecer - se saem muito bem disso - e nisso - tudo: o já citado FHC e, evidentemente, Lula. Pouco provável que o próximo seja alguém capaz de destruir o que foi conseguido a duras penas pela brava gente. De resto, é fortalecer o faminto de saber e comida, para que ele saiba distinguir retrato de canalha de rosto de gente de alma grande, gente que lava o rosto na pia e faz cocô na privada. E não o contrário.

4.28.2009

LUNETAS POUCO PRECISAS PORQUE ANTIGAS

As DIRETAS JÁ ficaram nos comícios, o Tancredo, no hospital, o Collor, no impeachment, a inflação, muito acima da capacidade do estádio. Por isso é que foi substituída por juros muito acima da capacidade do estádio. Depois que fomos a pique, descobriram a pólvora e puseram um banqueiro à frente do Banco - o Central - que, depois, foi substituído por outro banqueiro. Privatizaram, não privatizaram, privatizaram de novo e estamos aí. Aqui. Firmes. Nós e o cara. A cara. E os outros. A abundância, a falta, o pingo, a torneira, a lata. Assim funcionamos: quando abundantes queremos abundar mais, quando temos falta nos viramos para matar a sede, transbordamos de vez em quando, nos vendemos por um pingo, na cabeça, a cabaça. Não foi terra o que avistaste, Cabral. Foi água.

4.19.2009

MUROS

Segundo o livro CIDADE PARTIDA, de Zuenir Ventura, do início do século XX até o seu final, a quantidade de favelas no Rio passou de uma para 500. Há que diga que, hoje, são 700 ou quase 1.000 - e que, por exemplo, em Florianópolis, com seus cerca de 400 mil habitantes, já são dezenas.

O governo do estado do Rio de Janeiro começou a construir muros nas favelas cariocas - em 13 delas -, totalizando 14,6 km lineares e o custo de 40 milhões de reais.

Há algumas questões que se levantam por si:

1. Se o número é de 500, 700 ou 1.000 favelas, enquanto construírem muros em 13 restarão 487, 687 ou 987 sem muros;
2. Mesmo quem defende a construção – por exemplo, a revista VEJA – afirma que os muros por si, sem fiscalização, serão incapazes de impedir a expansão das favelas;
3. Morros sempre são acessíveis por mais de um caminho - e o projeto não prevê, como chegaram a pensar – e temer - alguns daqui e de fora, muros poligonais coibindo ou dificultando todo e qualquer acesso às favelas;
4. A um custo unitário que, segundo especialistas, seria viável, de 20 mil reais, a quantia que dizem que custarão os 14,6 km de muros em 13 das 500, 700 ou 1.000 favelas cariocas seria a mesma para construir 2.000 (duas mil) casas populares.

Portanto, antes de qualquer juízo ético, é fácil de ser percebido que a construção desses muros é injustificável por qualquer rudimentar e simplista raciocínio prático, econômico, ou mera, pobre, tosca, minimamente lógico.

Saindo do terreno pragmático e adentrando em outro cuja subjetividade é quase nula, a dedicação brasileira à persistência e à manutenção de construções feitas pelo poder público é igualmente quase nula; é de se apostar que esses muros, se sua construção chegar ou não ao final, muito em breve serão ruínas.

Agora vamos deixar de vez a obviedade e pular o muro brasileiro da hipocrisia.

Em um país cuja sociedade achou prático e natural que em um século fossem construídas 500 ou mais favelas na cidade que, durante cerca de 60 anos do mesmo século, foi sua capital; que considerou igualmente prático e natural que em outras cidades de perfil montanhoso fossem construídos barracos e mais barracos em seus morros e, nas planas, que parte da população se espremesse em caixotes de madeira ou papelão montados à beira de estradas; que se comporta como o paciente de psicanálise que inicia seu tratamento falando da mãe e acaba por tratar da, às vezes, já falecida mãe e não de si, como aqui se faz, culpando eternamente os portugueses e suas capitanias hereditárias; que em grande parte acha bonito e natural entupir as narinas de pó e empinar as mesmas narinas a exigir segurança e direitos; que sabe que os políticos são de baixo nível porque a população em sua maior parte é facilmente manipulável, porque desesperada, encantada pelo primeiro santinho acompanhado de cesta básica, vale-combustível, torneira, escada ou proximidade à corja pútrida, - em um país assim, com uma sociedade assim, nada mais natural que se prefira construir muros à volta de pobres ao invés de pensar em alternativa que, mesmo e ainda que minimamente, se baseasse em orientação, educação, diálogo, leis, inclusão. À brasileira, é melhor construir, justificar, pichar e deixar ruir um muro.

Principalmente, ficar em cima dele. E – prático e natural - atrás da moita.

4.12.2009

CARTA AO PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Caro Senhor Presidente da República:

Talvez o Sr. não se lembre. Raymundo Faoro foi contrário ao projeto da reeleição assim que iniciada sua defesa, quando o reeleito viria a ser o seu antecessor, Sr. Fernando Henrique Cardoso. Como em tantas outras vezes, o saudoso jurista e historiador estava com a razão.

Sem recorrer aos argumentos dele, é de impressionar o quanto o Poder é mesmo capaz de transformar indivíduos e quanto maior é a transformação à medida em que o tempo passa. Difícil imaginar o corajoso líder sindical de outrora, que conduziu uma greve em plena ditadura militar, comparando obras da envergadura das do "PAC" com o corte das suas unhas ou o batom da sua candidata e ministra.

Quanto a ser ou não chique emprestar dinheiro ao FMI, duas afirmações podem ser feitas, Sr. Presidente: (1) o dinheiro não lhe pertence; e (2) não há nada que seja ou possa vir a ser chique nesta crise. Quanto a esta ser espécie de marolinha, pergunte a alguém que esteja desempregado se pensa assim - é o que se lhe pode sugerir, Sr. Presidente.

Ainda sobre o empréstimo ao FMI, adicionalmente, é de se arriscar duas suposições. A primeira: como o Brasil é membro do Fundo e, este, um órgão destinado a emprestar a países-membros em risco de insolvência, deve, sim, ter havido uma proposição de que fosse feito o empréstimo, e não, deste, uma oferta expontânea por parte dos nossos representantes. A segunda: por várias razões que poderiam ser supostas em extensão, é bem pouco provável que a proposição pudesse ser recusada pelos mesmos mencionados nossos representantes.

Voltando agora um pouco no tempo - porque é do tempo, no Poder, que se tem aqui como tema -, quando os aeroportos e vôos comerciais se tornaram um caos, é de se esclarecer, Sr. Presidente, que se a classe média nunca tomou banho frio, tampouco quente era a ela possível tomar - posto que não há chuveiros nos aeroportos, nem mesmo naquele em que o personagem do Tom Hanks fica detido. A classe que viajava, média ou não, incluía empresários, trabalhadores da iniciativa privada e estatais, religiosos, artistas, políticos, ministros...

Sr. Presidente, quando o Sr. fala da Petrobrás ou do Banco do Brasil, essas empresas têm como acionistas (a) investidores em ações da Bolsa de Valores e (b) esse conjunto difuso, pouco visível de longe, o povo.

Suas palavras são sempre poderosas, dado ao cargo que o Sr. ocupa, Sr. Presidente da República.

Sr. Presidente, o que também é certo é que o Sr. sabe disso tudo; apenas e lamentavelmente, o tempo no Poder tornou distante a imagem de bravura e coragem do líder sindical, trocada, como se fosse figurinha de álbum de criança,
pela de alguém que já não sabe mais distinguir que papel de fato desempenha, onde e quando. Principalmente quando. Raymundo Faoro estava com a razão.

4.02.2009

ORIGEM - E EVOLUÇÃO

Do mar à praia
Até as estepes

Pela relva
Até a montanha

A casa.

Depois
O cerco.