Todo homem sabe que nasceu para
coadjuvante. Por isso os idiotas são machistas e os outros aprendem a não ser. A
mulher é que nasceu para o estrelato. Isso fica evidente por exemplo na
cerimônia de casamento, quando a noiva é a esperada, e o noivo, mais um a
esperar por ela.
Nos primeiros anos de vida de uma
criança, a mãe, por ser uma estrela, é propriedade da criança, enquanto o pai,
quando muito um planeta fora de órbita, o seu brinquedo. Antes do nascimento, a
barriga da mãe é a casa; depois, a criança muda de casa e vai morar no colo e
nos seios da mãe. Brincar com o quê? Com bichinhos de pelúcia e penduricalhos
do berço? Ora, pra que, se o pai está por perto? O colo da mãe é o melhor lugar
para chorar e chorar até exasperar; o do pai, para achar graça das sacudidas,
dos barulhos e das caretas que ele faz.
Quando Maria Luiza nasceu, havia
um clube de futebol chamado Botafogo. Já quando o pai da Maria Luiza era garoto,
havia um esporte chamado futebol, quando o Botafogo teve dois timaços, um logo
depois do outro. De Garrincha, Nilton Santos, Didi, Amarildo e Zagalo a Carlos
Roberto e Gerson, Rogério (depois Zequinha), Roberto, Jairzinho e Paulo Cesar. Isso
sem falar em todos os outros jogadores daqueles dois assombros aos olhos dos
competidores e admiradores de todo o mundo. Já lá em 1995, o Botafogo se
sagraria campeão brasileiro, e o prenúncio disso foi o ano de véspera, quando
Maria Luiza nasceu. Entre muitas e grandes qualidades, seu avô tinha lá seus
defeitos e torcia para o Flamengo, algo que passou para a mãe da Maria Luiza.
Aos três anos de idade, ela provou que pai é brinquedo e mãe propriedade.
- Mamãe, você tem que torcer pelo
Botafogo.
- Mas eu sou Flamengo, filha.
Era hora do beiço tomar o lugar
do lábio.
- Você tem que ser Botafogo, mãe!
- Tá bom, filha, eu sou Botafogo,
pronto.
- De verdade, mãe?
- De verdade, filha. (Por alguns
anos, somente.)
Ser botafoguense nada tem de
sofredor, mais uma que aprendi por ser pai da Maria Luiza. Hora de falar de
outro alvinegro: o Figueirense, de Florianópolis, onde moramos desde que o
mundo acabou, em 2000. Enquanto o Botafogo tem na camisa a poética estrela
solitária, o Carlitos daqui traz em seu escudo a bela figueira-símbolo da Ilha
da Magia (embora seu estádio fique no continente, mas isso é pra ser dito pelos
torcedores do Avaí). Tanto do Botafogo quanto do Figueirense, nenhum torcedor
se esquece da semifinal da Copa do Brasil de 2007. Uma bandeirinha anulou
injustamente dois gols do Glorioso, que, apesar de assim mesmo ter vencido por
3 a 1, foi desclassificado com o resultado (coisas do futebol, coisas do
Botafogo). Maria Luiza viu o jogo ao meu lado por um tempo, até que foi para o
quarto, teria que acordar cedo. Da sala, furibundo, protestei. Ainda acordada,
Maria Luiza, na estrada dos louros, um facho de luz, a estrela (que não é
solitária) que me conduz, me fez constatar:
- Nós ganhamos, pai. Fizemos
cinco e eles um.
Tal como cantaram Emilinha Borba
e Gal Costa, assim se passaram dez anos, dos três aos treze da Maria Luiza. Se
voltaremos ou avançaremos no tempo nos próximos capítulos, todo flamenguista
sabe: só o tempo dirá.
(Aqui cabe um PS, ainda por cima entre
parênteses. Ao ler esse texto, Carine Bergmann, produtora do Cidadão Mario, espantou-se
pelo apreço da minha família pelo futebol. Rosa nunca se interessou pelo tema, e
Maria Luiza só até certo ponto, e já não mais: descobriu coisas bem mais
interessantes, como a Medicina, entre outras. Da minha parte, prefiro fazer do futebol
o mesmo que ela fazia comigo em seus primeiros anos de vida: um brinquedo.)
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