10.07.2008

MACACOS NA PRAIA

Depoimentos de pessoal de cinema que filmou no Brasil apresentados no documentário "Olhar estrangeiro" incluem algumas pérolas, como a de quem pôs um macaco a passear entre beldades na praia de Ipanema. Questionado, o diretor retrucou: - Não há macacos em no Brasil? - e ouviu o, para nós, óbvio: na praia, não. Mas nenhum se compara ao comentário do ator Michael Cane: "Se vocês querem ser levados a sério, parem de fazer gente bonita e de ser alegres. Meu país faz um monte de gente feia, dificilmente demonstra alegria e sempre é levado muito a sério".

(Enquanto, por exemplo, uma Ana Miranda, para escrever Boca do Inferno, vai às últimas para pesquisar, narrar e recriar, o "olhar estrangeiro" sobre nós chuta, mistura lingua espanhola com a portuguesa, selva com praia, e... ganham mais dinheiro.)

Michael Cane, em seu comentário, foi, mais que qualquer outra coisa, inglês: usou do humor e da gentileza para se expressar e se desculpar por gafes cometidas por colegas seus de arte e profissão, das quais inclusive fez parte. Muito mais do que isso: tocou numa ferida exposta; num recorrente mal genuinamente brasileiro.

Não à toa a associação de alegria e sensualidade com falta de seriedade nas coisas vem de fora e associada ao Brasil - porque ela começa é aqui, no Brasil. A brincadeira do ator inglês mostra que humor pode ser muito bem associado a seriedade e, mais ainda, a deter poder, permanecer no poder, ser visto como civilizado e rico, ainda que os tempos do british empire já se tenham ido, sem sequer deixar, esquecidos, fraques, cartolas e bermudas com meias três quartos na Índia do Ghandi. A falta de seriedade, especialmente na condução da coisa pública, no Brasil, nada tem a ver com humor. Não passa de deboche, e deboche não pode ser confundido nem mesmo com humor ruim. É deboche, nada mais que deboche: desrespeito; sensação de impunidade.

Portanto, que não venham os debochados a nos roubar nosso genuíno e mundo afora admirado humor. Muito menos você, gente instruída, culta, ilustrada, a se deixar levar nessa onda debochada e desrespeitosa. Caso contrário, aguente firme - e pague para ver filme inglês com macaco passeando em Ipanema. Pague por isso mesmo: mico.

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