10.07.2006

24 – CAVERN CLUB

“RITMOS DE BOATE” e “CAVERN CLUB” foram dois programas de rádio no Rio de Janeiro, com o “DJ” Big Boy, nos anos setenta do século passado – conta Maria Eduarda à irmã caçula, por telefone. “Big Boy rides again” – era assim que ele abria seus programas. Flávia está aflita: ninguém gosta do nome “Lennon e Vinicius” nem aceita que exista uma canção do brasileiro cuja letra se assemelhe em utopia a “Imagine” – sendo que seria de todo absurda qualquer hipótese de um ter influenciado o outro, fosse na ordem que fosse, tal a distância de ritmos, trajetória e linguagem dos dois, ainda que tenham sido contemporâneos e que coincidências, determinações divinas ou sincronismos lhes tenham tirado as vidas no mesmo ano: 1980. Maria Eduarda sugere à irmã que Vinicius se junte a Louis Armstrong e Pixinguinha no atual Satchmo e Pixinguinha e que o “Lennon e Vinicius” passe a se chamar “Cavern Club”, nome do lugar onde os Beatles se apresentavam na sua distante Liverpool em seu início de carreira e que batizou um dos programas do “DJ”, um dia encontrado morto em um quarto de hotel no Rio.

- Isso dará identidade ao bar que está fracassando e um “gancho” para um relançamento do complexo como um todo – é o que opina Maria Eduarda, e Flávia admite que a irmã mais velha teve uma boa idéia.

- Qual passará a ser o nome do “Satchmo e Pixinguinha”? – querem saber as sócias de Flávia: Rita, Renata e Cláudia. Flávia, que viveu alguns namoros, tendo sido um deles desses que deixam marcas de difícil cicatrização; Rita, que foi estuprada e quem morreu foi o estuprador – de parada cardíaca; e ninguém apareceu para reclamar o sumiço dele, como contou a Renata o policial que investiga a morte do velho cujo cadáver foi encontrado de calças arriadas, perto de uma etiqueta deste complexo onde estamos inseridos, NOITE E DIA, LIVRO E FANTASIA; Renata, que, como Flávia, conhece características físicas do assassino do advogado, crime que vem sendo há alguns meses investigado pela Polícia Federal e também pela Civil (Renata chegou a conhecer-lhe a voz e a proximidade); e Cláudia, que tem ciúmes permanentes do marido Angus, indivíduo de características físicas nada ou pouco atraentes para a maioria das mulheres e que foi capaz de atrair – momentaneamente – a amiga e sócia Rita - sem que Cláudia e o escocês descendente de celtas sequer tenham desconfiado disso.

(Como de todo e presumivelmente, nenhum celta deve ter desconfiado – a não ser que um de seus druidas seja capaz de não só desconfiar como tramar e provocar esse tipo de situação.)

Flávia pensa em criar mais um bar, dividindo o “Satchmo e Pixinguinha” em dois; Renata e Rita são contra - este vem fazendo sucesso e se mantendo cheio com o tamanho que tem – e propõem que o “Lennon e Vinicius” é que seja dividido em dois; Cláudia reage, De jeito nenhum, a ilha é um santuário de “covers” dos Beatles, vai encher sempre e exatamente no seu atual tamanho, especialmente com a nova personalidade - ela argumenta, enfaticamente.

Depois de fumaçadas do cigarro de Cláudia e correspondentes abanares das demais, as quatro decidem que o “Satchmo e Pixinguinha” vai continuar se chamando assim; e que aqui, doravante, vamos nos chamar “Cavern Club”. Agora é reformar e divulgar e assunto encerrado – Cláudia diz e se levanta, esmagando o que sobrou de um cigarro no cinzeiro.

É quando Flávia mergulha em profundos pensamentos e sai daqui sem mesmo se despedir das amigas, como se estivesse em uma espécie de transe, triste da saudade e dos traumas do amor fracassado, confusa com o rumo da sua vida, que vem sendo rondada de perto por duas mortes, uma presenciada por ela, a outra, vivenciada por Rita.

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