4.12.2009

CARTA AO PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Caro Senhor Presidente da República:

Talvez o Sr. não se lembre. Raymundo Faoro foi contrário ao projeto da reeleição assim que iniciada sua defesa, quando o reeleito viria a ser o seu antecessor, Sr. Fernando Henrique Cardoso. Como em tantas outras vezes, o saudoso jurista e historiador estava com a razão.

Sem recorrer aos argumentos dele, é de impressionar o quanto o Poder é mesmo capaz de transformar indivíduos e quanto maior é a transformação à medida em que o tempo passa. Difícil imaginar o corajoso líder sindical de outrora, que conduziu uma greve em plena ditadura militar, comparando obras da envergadura das do "PAC" com o corte das suas unhas ou o batom da sua candidata e ministra.

Quanto a ser ou não chique emprestar dinheiro ao FMI, duas afirmações podem ser feitas, Sr. Presidente: (1) o dinheiro não lhe pertence; e (2) não há nada que seja ou possa vir a ser chique nesta crise. Quanto a esta ser espécie de marolinha, pergunte a alguém que esteja desempregado se pensa assim - é o que se lhe pode sugerir, Sr. Presidente.

Ainda sobre o empréstimo ao FMI, adicionalmente, é de se arriscar duas suposições. A primeira: como o Brasil é membro do Fundo e, este, um órgão destinado a emprestar a países-membros em risco de insolvência, deve, sim, ter havido uma proposição de que fosse feito o empréstimo, e não, deste, uma oferta expontânea por parte dos nossos representantes. A segunda: por várias razões que poderiam ser supostas em extensão, é bem pouco provável que a proposição pudesse ser recusada pelos mesmos mencionados nossos representantes.

Voltando agora um pouco no tempo - porque é do tempo, no Poder, que se tem aqui como tema -, quando os aeroportos e vôos comerciais se tornaram um caos, é de se esclarecer, Sr. Presidente, que se a classe média nunca tomou banho frio, tampouco quente era a ela possível tomar - posto que não há chuveiros nos aeroportos, nem mesmo naquele em que o personagem do Tom Hanks fica detido. A classe que viajava, média ou não, incluía empresários, trabalhadores da iniciativa privada e estatais, religiosos, artistas, políticos, ministros...

Sr. Presidente, quando o Sr. fala da Petrobrás ou do Banco do Brasil, essas empresas têm como acionistas (a) investidores em ações da Bolsa de Valores e (b) esse conjunto difuso, pouco visível de longe, o povo.

Suas palavras são sempre poderosas, dado ao cargo que o Sr. ocupa, Sr. Presidente da República.

Sr. Presidente, o que também é certo é que o Sr. sabe disso tudo; apenas e lamentavelmente, o tempo no Poder tornou distante a imagem de bravura e coragem do líder sindical, trocada, como se fosse figurinha de álbum de criança,
pela de alguém que já não sabe mais distinguir que papel de fato desempenha, onde e quando. Principalmente quando. Raymundo Faoro estava com a razão.

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