11.13.2010

TIRIRICA E TRÊS QUESTÕES DE PROVA

Ele foi o recordista nacional de votos para a Câmara Federal. Durante sua campanha, ensaístas de peso alertavam que, eleito com expressiva soma de votos, por causa do voto proporcional de legenda, Tiririca levaria consigo muitos presumíveis, conhecidos ou potenciais picaretas para lhe fazer companhia no Congresso.

A primeira questão de prova é: aqueles que os ensaístas de peso gostariam de alertar não sabem que eles, ensaístas, existem, muito menos o que seja ou faça um ensaísta. É possível que os ensaístas quisessem que nós, que lemos seus embasados ensaios, fôssemos formadores de opinião, multiplicadores dos seus conceitos, impedindo assim que Tiririca o fosse de votos.

É quando passamos para a segunda questão.

Existe um senso comum no Brasil de que há uma grande massa de gente que precisa ser orientada, ensinada, doutrinada. Este, por exemplo, é o pensamento de quem acha que os meios de comunicação devam ser regulamentados e regulados – para que a informação chegue de forma adequada à massa de gente que precisa ser adequadamente informada. Uma boa fonte de consulta para se conhecer a arte de fazer a informação chegar de forma adequada seria a ditadura militar que governou o Brasil de 1964 a 1985 - a não ser que se prefiram soluções importadas; se assim for, a Venezuela de Chaves poderá ser a fonte.

Tirirca eleito, o fizeram passar por um teste do seu grau de alfabetização. Analfabeto pode votar, mas não exercer um mandato, segundo consideram alguns – sim, há discordâncias entre magistrados a esse respeito. Se pode ou não um analfabeto votar ou exercer mandato popular, seria a verdadeira questão?

Terceira questão: pode haver analfabetos no Brasil? É admissível que os haja neste século?

Eleitores votam em candidatos com os quais se identificam. Os ensaístas costumam ter seus candidatos preferidos, assim como os magistrados, os católicos e os evangélicos. O que foi constatado é que há muitas pessoas que se identificam com alguém que diz que, segundo ele, como elas, não sabe o que acontece no Congresso, mas que, chegando lá, se compromete a contar, e que “pior do que está não pode ficar”.

Muita pretensão querer ensinar alguém a votar ou a ler notícias. Mais razoável seria que quisessem que se ensinasse a todos a ler e escrever, duas únicas ferramentas das quais precisa, por exemplo, um ensaísta. Quem sabe - de fato - ler e escrever, sabe discernir; quem discerne, se for de boa fé, sentirá nojo só de pensar na hipótese de que alguém se proponha a regulamentar e regular o que todos leremos ou assistiremos daqui em diante.

Não é o Tiririca que precisa melhorar. O que precisa melhorar é o Brasil - sua torpe mentalidade de canastrões fantasiados de sábios, a olhar os simples como inferiores, a serviço dos abutres de plantão, que se refestelam da simplicidade naquilo que ela tem de ignorante, a querer e fazer que a ignorância se perpetue e se multiplique.

5 comentários:

Aldo Votto disse...

Caro Mario próximo do aniversário,

Teu oportuno texto aponta um tema que está na minha pauta desde o período da campanha. A figura estilizada do palhaço-deputado poderia servir de logomarca para estes tempos de recrudescimento dos preconceitos.
Ele é ícone de alguns deles: o de classe; o regionalista e o intelectual.
Infelizmente eles não são os únicos a ressurgirem do subsolo, espanando-se da própria gosma fétida e pré-histórica e revelando-se à luz. Estão acompanhados do óbvio preconceito de gênero que, por exemplo, no fundo, foi a razão que elevou aos píncaros da polêmica pretensamente erudita a validade do uso do ajetivo presidenta.
E paro por aqui para não macular com mais exemplos de preconceitos este alvo espaço para comentários.
Mas, para terminar, compartilho uma das minhas indignadas constatações no caso que analisaste: a fúria moralista dos ensaístes, colunistas políticos e quetais foi toda dirigida ao candidato e não aos "abutres de plantão" 'donos' do partideco e financiadores da campanha bem sucedida do iletrado representante do iletrado milhão de eleitores que, muito provavelmente, não eram nem remotamente representados pelos letrados de tantos e tantos mandatos anteriores.
Um grande abraço,
Aldo

Aldo Votto disse...

EM TEMPO

É preciso registrar que o palhaço-deputado açulou os preconceitos contra ele durante a propaganda na TV, utilizando-se da arma que os "abutres de plantão" e os "canastrões fantasiados de sábios" mais detestam: o deboche!
Mais um abraço,
Aldo

wheliton serra disse...

Confesso que achei engraçado quando vi o vídeo da campanha, mas logo em seguida fiquei indignado, achei uma banalização da política e finalmente pensei: a política não é levada a sério mesmo é só mais um palhaço, afinal foi o povo que o elegeu e isso é o legítimo significado da palavra democracia, fazer o que?
Parabéns pelo blog, criei um agora e pretendo falar sobre coisas relevantes e atualidades.
http://votedizer.blogspot.com/

Anônimo disse...

concordo em n° gênero e grau com vc! A falta de respeito está danada.. e é de nós conosco mesmo, pq a "tentiada é livre" enquanto alguns liberam, os espertos tentam, cabe a nós decidirmos. E esta foi mau!!

UM abraço, adorei o blog.

Flávia disse...

gostei muito do seu último post. A partir de hoje estou seguindo o seu blog. :D
parabéns!