A partir dos 12 anos, atenção: é proibido pagar mico. Por exemplo, andar de mãos dadas com o pai e a mãe. Aqueles beijos e abraços apertados, só em casa. E olhe lá – porque o vizinho pode estar olhando e, se ele tiver 13 anos...
Do lado de cá, de quem carregava o filho ou a filha pela mão – depois de muito tempo no colo -, não se deixe emocionar em comédia romântica na companhia dela. Na dele, sequer proponha uma. Desandar de dar risada e gargalhada em desenho animado, esteja certo: vão chamar a ambulância.
Tio. Esse é o seu nome – a não ser que seu sexo seja o feminino; nesse caso, oi, Tia, muito prazer.
Prazer inclusive de ver sua sala abarrotada deles e delas, sentados no chão, encostados na parede, chão e parede recheados de bolo para todo o sempre. Antes fosse: esse paraíso acabará e você vai se tornar o maior religioso de todos os tempos. Seu colar – você usará um – trará um crucifixo entre a estrela de David e uma figa, assim que o passeio de quem você trocou as fraldas passar a ser com João ou Maria. Maria tem carteira de motorista; João rouba o carro do pai. Há os gêmeos, também: Rafael e Gabriel, cada qual com sua moto. Lucas não tem dinheiro, mas bicicleta, sim. Primeiro, ele tirou a camisa enquanto pedalava e a danada cismou de enrolar na roda dianteira e ele foi de cara no chão; depois, Matheus, que tem menos dinheiro ainda e casa não tem, mas revolver, sim, levou a bicicleta de Lucas – agora, com uma bicicleta e 3 dentes a menos. Onde anda Salomão?
Melhor parar o relógio e perguntar, sem ofender: quem inventou o mico terá sido alguém com inveja de quem anda de mãos dadas com a filha ou o filho?
Pode até ter sido. Mas isso não lhe dava o direito de ter gritado LINDÃOOOOOOO quando ele fez aquele gol de placa. Menos ainda de ter socado o juiz porque o gol de placa foi com a mão e, consequentemente, anulado. Está ouvindo, agora? A sirene é a mesma da ambulância; mudou foi a cor do carro.
Mico.
O DIÁRIO DO MARIO contém crônicas e poemas de Mario Benevides, além do embrião do romance A REVOLUÇÃO DO SILÊNCIO, do mesmo autor, publicado em 2007 pela Design Editora, aqui no blog com o título A DINASTIA DE RICARDO CORAÇÃO DOS OUTROS.
1.16.2007
1.11.2007
O MAIS FORTE
Escondia-se. Exibia-se. Aparecia porque grande era sua cabeleira. Claro, era ela que lhe mantinha protegido; escondido. Veio um corte de cabelo indesejado e o que ele gostava de esconder ficou à mostra; aquilo que exibia fora embora. Veio uma mudança. Era da casa antiga o seu aconchego. Foi ficando triste. Vieram umas férias, uma viagem – ele gostou. Foi quando o mais forte sentiu-se incomodado e partiu pra cima dele e ele quase morreu. Poderia ter acontecido com qualquer um: o mais forte se incomoda e o mais fraco é que se muda – ou morre. Hoje ele anda jururu, mascando seus bigodes, impedido de coçar a mandíbula, temporariamente reforçada por uma prótese, por um anteparo. Espécie de noviço rebelde, assim ficou o poodle depois de atacado pelo pit-bull. Este, por sua vez, ninguém sabe como ficou. Apenas se sabe que continua sendo o mais forte.
1.09.2007
VIVAS E MANIFESTOS
A visita de um poeta é sempre bem vinda. O poeta Aldo Votto ainda nos visita; mais: manifesta-se - a nós. E a nós ultramarinos. Vivas a ele, que, como bom poeta, nos mantêm vivos, interessados, ativos. Em resposta nos manifestamos nós (plural e, portanto, covardemente):
Fui ator não vou ao teatro.
Escrevo poemas não leio poetas.
Que pretensão será esta
Egoísmo será este
Fazer e não querer saber
Do que fazem os outros – os de verdade?
Leio Equador
De autor português contemporâneo
A narrar fios e meadas de dom Carlos
Rei
Que viria a ser morto por revoltosos
Idos de 1905-8
São Tomé e Príncipe
Ilhas
Colônias portuguesas
Equatoriais.
Lá
Descubro-me navegador
Ansioso por aventura
Engenharia e poesia incapazes dela.
Novas e naufragadas Friburgos
Encharcados Rios geralmente praianos
Metralhados e incendiados inocentes
Respondei:
Há lugar
Longe do naufrágio
A salvo do incêndio
Perto da aventura?
Haverá lugar a inda
Para sonhadores
Que sonham tão somente transformar? Sem o saber?
Sigamos.
Vendas nos olhos
Vendavais nos ouvidos
Chuvas torrenciais
Sóis cegadores
Preconceitos e medos e seus desastrosos consertos
Sigamos.
A fazer e pouco ler poesia.
Mais a representar que assistir a intérpretes.
A nos alimentar de manifestos
Mais que nos manifestar.
Vivas a eles manifestos.
Vivamos.
Fui ator não vou ao teatro.
Escrevo poemas não leio poetas.
Que pretensão será esta
Egoísmo será este
Fazer e não querer saber
Do que fazem os outros – os de verdade?
Leio Equador
De autor português contemporâneo
A narrar fios e meadas de dom Carlos
Rei
Que viria a ser morto por revoltosos
Idos de 1905-8
São Tomé e Príncipe
Ilhas
Colônias portuguesas
Equatoriais.
Lá
Descubro-me navegador
Ansioso por aventura
Engenharia e poesia incapazes dela.
Novas e naufragadas Friburgos
Encharcados Rios geralmente praianos
Metralhados e incendiados inocentes
Respondei:
Há lugar
Longe do naufrágio
A salvo do incêndio
Perto da aventura?
Haverá lugar a inda
Para sonhadores
Que sonham tão somente transformar? Sem o saber?
Sigamos.
Vendas nos olhos
Vendavais nos ouvidos
Chuvas torrenciais
Sóis cegadores
Preconceitos e medos e seus desastrosos consertos
Sigamos.
A fazer e pouco ler poesia.
Mais a representar que assistir a intérpretes.
A nos alimentar de manifestos
Mais que nos manifestar.
Vivas a eles manifestos.
Vivamos.
1.05.2007
IRREGULAR
Eis aqui um lugar
Freqüentado por poucos
Todos de idoneidade assegurada
Ainda que freqüentadores
Deste lugar
Que,
De tão pouco freqüentado,
Mal dá o que falar.
Serve este espaço
Muito mais para organizar
Aquilo que não pode:
A obra errática, anti-sistemática
De seu ocupante-anfitrião.
Que não se exija dele portanto nada
Que não a mais completa irregularidade.
Tudo que sai na capa só foi verdade por indeterminado tempo:
Hoje é dia de crônica
Amanhã ou quem sabe quando,
Um capítulo.
Que dia é hoje?
Por aqui, não se sabe.
Se, ainda assim, você, de idoneidade assegurada ou não,
Quiser visitar este lugar,
Será um prazer.
Deixe sua queixa, por favor:
Será sempre bem-vinda.
Queixe-se do assunto e da sua falta; da forma; do des-conteúdo.
Mas venha sempre – até que uma multidão nos separe,
Uma frente fria,
Um crime hediondo,
Uma roubalheira infame
Nos separe.
Ou nos una.
Irregularmente.
Como deve ser.
Freqüentado por poucos
Todos de idoneidade assegurada
Ainda que freqüentadores
Deste lugar
Que,
De tão pouco freqüentado,
Mal dá o que falar.
Serve este espaço
Muito mais para organizar
Aquilo que não pode:
A obra errática, anti-sistemática
De seu ocupante-anfitrião.
Que não se exija dele portanto nada
Que não a mais completa irregularidade.
Tudo que sai na capa só foi verdade por indeterminado tempo:
Hoje é dia de crônica
Amanhã ou quem sabe quando,
Um capítulo.
Que dia é hoje?
Por aqui, não se sabe.
Se, ainda assim, você, de idoneidade assegurada ou não,
Quiser visitar este lugar,
Será um prazer.
Deixe sua queixa, por favor:
Será sempre bem-vinda.
Queixe-se do assunto e da sua falta; da forma; do des-conteúdo.
Mas venha sempre – até que uma multidão nos separe,
Uma frente fria,
Um crime hediondo,
Uma roubalheira infame
Nos separe.
Ou nos una.
Irregularmente.
Como deve ser.
Assinar:
Postagens (Atom)